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A alta vertiginosa do IGP-M e a possibilidade de renegociação dos índices de reajustes contratuais

A alta vertiginosa do IGP-M e a possibilidade de renegociação dos índices de reajustes contratuais
IGP-M teve alta histórica em 2020 e está afetando de maneira significativa as relações contratuais.

por Thiago Pereira

Uma alta vertiginosa
Entre os indexadores mais utilizados em contratos de prestação de serviços e, especialmente, em contratos de locação, o IGP-M teve uma alta histórica em 2020 que está afetando significativamente as relações contratuais.

Para se ter uma ideia da escalada do índice no ano de 2020, nos 10 anos anteriores o indicador registrou uma variação média de 6,55%, enquanto que, só em 2020, o acumulado alcançou a marca dos 23,14%.

Se analisarmos, ainda, uma janela de tempo mais atual, verifica-se que o indicador teve uma alta de 32,02% no acumulado dos 12 meses encerrados em abril.

Cenário: a pandemia e a moeda americana
O Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M) tem como base de cálculo três outros indicadores. O Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA), o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) e o Índice Nacional de Custo da Construção Civil (INCC).

Em adição ao cenário de 2020, marcado pela pandemia global de Covid-19, o país também enfrentou também uma forte desvalorização cambial, com a moeda americana acumulando uma alta de mais de 34% em relação ao Real.

Considerando que boa parte dos itens que influenciam o comportamento do IGP-M são commodities da Indústria e do Agronegócio, a alta do Dólar teve uma influência também importante sobre a variação do IGP-M.

IGP-M como indexador de reajuste contratual
O artigo 421 do Código Civil (CC) explicita que a liberdade contratual «deverá ser exercida nos limites da função social do contrato», bem como que, «nas relações contratuais privadas», prevalecerá «o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual.»

Há previsão legal para a revisão e até mesmo a resolução dos contratos privados em face de eventos excepcionais e a pandemia e o aumento totalmente imprevisível do IGP-M são exemplos disso.

O CC, em seu artigo 478, resguarda o direito à resolução contratual quando a «prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para outra» parte, e «em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis».

A razoabilidade dos contratos
Para que não restem dúvidas acerca da legalidade e possibilidade da revisão contratual, vale mencionar também o artigo 421-A, que foi introduzido no referido código pela Lei da Liberdade Econômica, e que prevê que «os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção», permitindo, mais uma vez, a revisão contratual de maneira excepcional e limitada.

Considerando que a aplicação de índices de reajuste nas relações contratuais têm por finalidade a recomposição do valor da moeda no tempo, verifica-se, em muitos casos, uma rentabilidade exagerada e injustificada, na medida em que tal reajuste não acarreta a mera atualização monetária, mas sim um verdadeiro desequilíbrio contratual entre as partes.

De certo que, no momento da celebração de um contrato privado que tenha sido acordado o IGP-M como parâmetro para o reajuste de valores, nenhuma das partes concebia a possibilidade de uma elevação tão desproporcional do índice em relação aos últimos anos, muito menos da ocorrência de um cenário de pandemia.

Bem por isso, a alta descomunal do IGP-M enquadra-se perfeitamente nas Teoria da Imprevisão (artigo 317, CC) e da Onerosidade Excessiva (artigo 478, CC).

Para justificar a revisão contratual com base quanto acima explicitado, é necessário que a relação contratual preencha os seguintes requisitos básicos:

1. O contrato precisa possuir natureza de prestação continuada ou diferida;
2. A superveniência de um fato que tenha alterado as condições iniciais da contratação;
3. A imprevisibilidade do evento não seja relacionada aos riscos inerentes do contrato; e
4. A geração de desequilíbrio econômico entre as partes, com excessiva onerosidade para uma delas.

A revisão contratual na esfera judicial

Sem dúvidas, a alta do IGP-M acarretou um movimento de renegociação contratual, a fim de alterar o indexador convencionado, em especial nos contratos de locação civil e comercial.

No âmbito judicial, há decisões recentes ― e cada vez mais recorrentes ― sobre o tema.

A 24ª Vara Cível de São Paulo proferiu, liminarmente, decisão deferindo a substituição do IGP-M pelo IPCA (1) em um contrato de locação de uma planta fabril, cuja autora da ação (e locatária) é uma empresa multinacional do ramo de tintas.

A referida decisão, em seus termos, entendeu que o IGP-M refletiu «índice muito superior ao da inflação real do mesmo ano».

A decisão fundamentou, ainda, que «a aplicação de índice de reajuste em desacordo com a real inflação do país pode tornar inviável a atividade econômica da requerente.»

No Rio Grande do Sul, foi obtida decisão semelhante, porém, posteriormente a decisão foi suspensa pelo TJ-RS. Em ação civil pública ajuizada pelo Sindicato dos Lojistas do Comércio de Porto Alegre (SINDILOJAS) em face dos três principais shoppings centers da cidade, havia sido deferido, em caráter liminar, a substituição do índice IGP-M pelo IPCA nos contratos de locação celebrados com os referidos shoppings. Entretanto, conforme mencionado, o TJ-RS suspendeu tal liminar (2) após recurso fundamentando que a ação seria incabível porque o caso não trata de direitos difusos, coletivos ou direitos individuais homogêneos, e que já teriam sido adotadas medidas visando uma redução substancial dos aluguéis e encargos dos lojistas.

De todo modo, é importante destacar que a judicialização do assunto deve ser a última alternativa a ser considerada, devendo ser privilegiada a negociação de boa-fé entre as partes.

Restando, entretanto, infrutífera a negociação, passa-se então à opção de acionamento do Poder Judiciário, visando a revisão do contrato.

(1) Processo n. 1123032-21.2020.8.26.0100
(2) Agravo de Instrumento n. 5050284-82.2021.8.21.7000/RS

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